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- Controlando o PACING
Alguns de vocês já devem ter ouvido falar de Pacing em um texto. Mas o que é Pacing? E como podemos controlá-lo para criar uma história que prenda a atenção dos leitores? Como controlar o Pacing Primeiramente, gostaria de chamar a atenção ao fato que, enquanto Pacing é traduzido para ritmo, não se limita apenas a isso. Controlar o Pacing é controlar a forma como os leitores, no subconsciente, leem uma história e em qual velocidade eles viram as páginas e chegam no final da história. Existem diversas formas de controlar o Pacing, mas uma das minhas favoritas é começar por controlar a forma como você formata seus parágrafos. Sei que parece estranho, mas pensem da seguinte forma. Quando se tem um diálogo escrito dessa forma: — Olá, James! — Oi, Mary. Como vai o marido? — Está melhorando, mas e você? Como estão as coisas no trabalho (…) Veja que em nenhum momento usei descrição ou narração fora o diálogo. Isso faz com que o leitor leia rápido, o que cria uma situação corrida, e tal coisa cria tanto um senso de urgência quanto banalidade. Agora, vamos fazer o processo oposto: — Olá James! — falou a loira, um sorriso cansado em seu rosto. Ao vê-la, James percebeu o quão frágil estava. Sua saúde se deteriorou, algo visível na forma como as roupas não cabiam mais em seu corpo e como seus cabelos estavam bagunçados. Era como se ela tivesse acabado de perder um filho. — Oi Mary — começou enquanto tentava não pensar em tais coisas. Ele já tinha muito em seu prato, e não podia se manter no passado. Não eram mais crianças do ensino médio. — Como vai o marido? — A pergunta foi marcada por um tremor em sua voz, um tique nervoso que obteve sempre que pensava no desgraçado. — Está melhorando, mas e você? — Mary não era tola e viu a forma como James mantinha-se irritado recentemente. Algo estava acontecendo com ele, algo que fazia-o prestes a explodir, e como uma bomba relógio, ela não conseguiria desarmá-lo a tempo. — Como estão as coisas no trabalho (…) Note que a segunda versão é rica em detalhes e descrições, coisas que podem ser percebidas pelo contexto da história, mas que são adicionadas de forma a dar um peso extra ao diálogo, de forma que o leitor leia e queira saber o que está acontecendo entre os dois. Enquanto o primeiro permite que o escritor faça um texto mais apressado, ele tira o peso de uma cena que, pode ou não, ser beneficial. Tudo depende não de nós mas sim do subtexto. Quando devemos manipular o pacing da história? Como falei, o contexto da história pode explicar bem o que está havendo de forma que não seja necessário encher o diálogo com detalhes supérfluos. No entanto, existe a possibilidade de que tais coisas não estejam claras, e que seja necessário que o autor dê dicas do que vai acontecer, ou do que aconteceu, ao citar detalhes. Com isso, o que temos que decidir antes de mudar o Pacing da história numa cena específica é se o subtexto pede por isso ou não. O exemplo que dei acima se encaixa bem nisso, pois não é só uma questão de algo estar ou não explicado, mas sim do quão importante é aquele ponto para a narrativa em geral. É necessário que saibamos dar o valor necessário a cada parte do texto. Estruturar sentenças Se estruturar parágrafos é uma forma de controlar o Pacing, também podemos estruturar sentenças. Vamos pegar o mesmo diálogo de antes como exemplo. — Olá James! — falou a loira, um sorriso cansado em seu rosto. Ao vê-la, James percebeu o quão frágil estava. Sua saúde se deteriorou, algo visível na forma como as roupas não cabiam mais em seu corpo e como seus cabelos estavam bagunçados. Era como se ela tivesse acabado de perder um filho. — Oi Mary — começou enquanto tentava não pensar em tais coisas. Ele já tinha muito em seu prato, e não podia se manter no passado. Não eram mais crianças do ensino médio. — Como vai o marido? — A pergunta foi marcada por um tremor em sua voz, um tique nervoso que obteve sempre que pensava no desgraçado. — Está melhorando, mas e você? — Mary não era tola e viu a forma como James mantinha-se irritado recentemente. Algo estava acontecendo com ele, algo que fazia-o prestes a explodir, e como uma bomba relógio, ela não conseguiria desarmá-lo a tempo. — Como estão as coisas no trabalho (…) Se prestaram atenção, verão que usei da comparação e metáforas (como foi destacado no exemplo) em alguns momentos. Isso ocorre pois quis que meu leitor prestasse mais atenção naquilo que escrevi e criasse uma imagem mental, ainda que subconscientemente. Para tal, usei da famosa "encheção de linguiça". Adicionar descrições, comparações, metáforas e outras figuras de linguagem para um texto dá a ele mais peso, e isso imediatamente diminui o Pacing para algo mais moderado. Em suma, podemos dizer que a velocidade do Pacing é definida pela quantidade de tinta preta se vê numa página. Não apenas isso, mas Sintaxe também é algo que ajuda na hora de controlar o Pacing a partir das sentenças. A estrutura padrão da oração é sujeito + verbo. Ainda assim, é possível adicionar objetos diretos ou indiretos, adjuntos, etc… Lembre-se, porém, que tipos de texto diferentes pedem Pacings diferentes. Um suspense não vai ser tão lento quanto um mistério. Uma cena de luta é muito mais rápida que uma de drama, onde Carla passa os momentos finais com seu marido, que está com Câncer. Tamanho dos capítulos Uma forma legal de controlar o Pacing de sua história também envolve a criação de capítulos curtos, de normalmente 2000 a 2500 palavras. Capítulos assim são como sacos de batatinhas. O leitor quer saber o que ocorre no outro, e por isso, vai seguir a leitura. Como vimos antes, o Pacing envolve a capacidade de fazer o leitor virar as páginas de um livro. Pacing na Narrativa Agora, entremos nas questões narrativas do Pacing. Quando escrevemos, existem momentos de ação e outros de quietude. Uma forma de controlar o Pacing é alternar entre esses momentos e usar a quietude para desenvolver alguns traços e características de personagens. Ninguém vai ler uma literatura onde não exista uma mudança na perspectiva do protagonista sobre o Conflito e momentos quietos, de interação pessoal, são ideais para mostrar a mudança na cabeça do personagem. Também podemos usar esses momentos de diálogo para mostrar o conflito interno dos personagens. Indicamos aqui os nossos artigos sobre conflito, além de um sobre tensão, caso não saiba o que é: Conflito e Tensão: Pontos Cruciais de uma História! e Como Aplicar Tensão na sua Obra. Mas no que isso altera o Pacing? Simples. Quando cortamos a ação, estamos fazendo com que o Leitor preste mais atenção nos momentos “quietos” da história. Lembram da estrutura de sentenças? Sim, aplicamos ela principalmente em momentos quietos, que queremos demonstrar a mudança do personagem. Não tenha medo de aumentar o número de linhas — claro, sem extrapolar —, faça algo que prenda a atenção do leitor, de forma que ele fique engajado no conflito interno do personagem. Outra coisa essencial para se trabalhar é a própria Tensão. A Tensão é o resultado do conflito sentido pelo leitor, e, por isso, em momentos de grande tensão, não podemos ter descrições supérfluas ou palavras obscuras. Deixe isso para momentos onde a tensão começa numa cena, como na introdução de um monstro numa história de horror, ou em momentos mais quietos. Mas nunca quando temos uma ação rápida. Lembre-se novamente do Subtexto e da sua importância. Dependendo do gênero que estamos trabalhando, isso pode se inverter. Numa cena de drama, queremos palavras simples num ritmo lento, de forma que possamos tratar bem o emocional. Já numa de terror, palavras complicadas, descrições exageradas e outras coisas destinadas a diminuir o Pacing são bem-vindas. Poder das palavras O importante é o tipo de cena que está trabalhando. Apenas lembre-se que as palavras que escolhemos tem mais poder do que damos valor e é exatamente por isso é que a semântica é um artifício tão útil para o Pacing. Podemos usar palavras complicadas e grandes numa descrição para aumentar a tensão e expectativa de algo. A palavra Mastodôntico, por exemplo, é perfeita para uma cena de horror, onde o monstro ou o cenário são enormes. Veja bem, sinônimos com mais sílabas que a original dão, no subconsciente, uma dimensão maior para a descrição. Mudar ordem dos eventos Em terceiro lugar, aumentar a tensão de uma cena mudando a ordem de eventos. Uma história que começa pelo final causará mais impacto do que uma que faz a ordem tradicional. Nós queremos saber como o desastre da cena inicial de “A pedra dos Desejos” ocorreu e por isso, vamos assistir os Flashbacks do filme com a expectativa de como as coisas chegaram lá, além do engajamento da audiência em juntar as peças. Uma obra que faz isso muito bem é Berserk. Temos o começo da história no arco do Espadachim Negro, alguns anos depois do arco do Eclipse — o segundo arco, que conta o passado do Guts — e queremos saber como o protagonista se tornou alguém tão cínico e cheio de ódio. Junte isso ao trabalho brilhante de Kentaro Miura após apresentar Griffith no final do arco e temos uma audiência engajada na história, uma tensão bem administrada após o Cliffhanger, o mistério que se segue disso, algumas peças para o que aconteceu além de ser o momento perfeito para o arco do Eclipse, que explicou o passado do personagem. Cliffhanger Falando no diabo, o Cliffhanger, ou gancho para os mais íntimos, é uma técnica narrativa e uma poderosa ferramenta no que tange ao Pacing. Cliffhanger é a arte de prender o leitor de forma que ele chegue ao final do capítulo e imediatamente leia o próximo. Para relacionar isso com Pacing, basta pensar no que disse até então. Para fazer um bom gancho, deve-se pensar na cena e em como ela é estruturada. Vejamos a estrutura de Dwight Swain, por exemplo. Ela pressupõe uma apresentação e, então, uma reviravolta. A parte de Desastre termina com a superação da adversidade, de forma que a próxima cena seja cíclica e o leitor continue a virar as páginas. Mas aí entra a questão: O que raios isso tem a ver com Cliffhanger? Bem, é simples. Se formos pegar a criação de capítulos curtos, não teremos espaço para essa estrutura, então o que faremos é, meramente, parar na parte do desastre e pôr a parte da superação em um capítulo mais adiante. Dessa forma, a história não para na mente do leitor. Não tenha medo de ser cruel. O nível de um desastre dita quantos capítulos vai demorar para a situação for resolvida e passarmos para a próxima cena da personagem. Temos um artigo sobre Cliffhanger aqui no blog, basta clicar aqui para ler! Velocidade da História Agora que falamos do aspecto psicológico do Pacing, falaremos sobre uma segunda faceta. Vamos falar sobre a velocidade que uma história se desenvolve. Essa parte está além da estruturação de parágrafos e vai para a estruturação da obra como um todo, a exemplo, capítulos e arcos. Vamos pegar, por exemplo, One Piece. One Piece tem um Pacing muito lento no que tange a velocidade da história, e isso ocorre pois o Oda usa muito do Foreshadow para gerar interesse. Algo inteligente. Para tal, ele põe várias informações e elementos numa mesma cena de um mesmo capítulo, tudo para que, num arco futuro — ou até mesmo num capítulo futuro dentro do mesmo arco — tenha-se a revelação que faça com que o leitor consuma mais e mais páginas e capítulos, o que entra na definição de Pacing que apresentei antes. A verdade é que o Foreshadow é uma ferramenta de Pacing muito poderosa, mas falaremos mais dele mais para frente. Antes de continuar, tenho que apresentar dois conceitos para vocês. Micropacing e Macropacing. Micropacing e Macropacing Como o nome fala, focam-se em coisas de tamanhos diferentes. Enquanto o Macropacing foca no mundo ao redor dos personagens e que permite que a história se desenvolva num ritmo acelerado, o Micropacing é quando exploramos os personagens. Voltando para One Piece, o Oda conseguiu manejar bem o Macropacing com o Micropacing. E o segredo dele é simples. A maioria dos arcos de One Piece focam-se num personagem central, que é desenvolvido e que a história gira em torno dele. Alabasta foca-se na Vivi; Arlong Park foca na Nami, e o arco mais recente, Wano Kuni, mistura os dois, focando em Momo e nos bainhas vermelhas, assim como explorando a história deles e do país, aproveitando para mostrar mais alguns mistérios do mundo. Claro, tem arcos que focam muito mais no mundo, e, portanto, no Macropacing. A exemplo, Skypea e Sabaody. Quando focamos no mundo, geralmente focamos não só no contexto atual dele, como também no passado. Não vemos apenas as cidades, mas também temos uma visão de quem as controla. Tais elementos do Macropacing, se bem trabalhados, dão a oportunidade de explorarmos os personagens e alternar para o Micropacing. Já que o Micropacing foca-se nos personagens, tem-se muito mais páginas falando sobre muito menos assuntos. E enquanto isso pode ser monótono se mal trabalhado, caso consigamos alternar entre os dois enfoques, temos a chance de ver o mundo e os personagens que vivem nele. Um exemplo de uma história focada em Micropacing é Death Note. Por mais que o anime tenha apenas 37 episódios, vale lembrar que a história de Light Yagami é, em sua essência, curta e breve. O foco é quase que exclusivo para os dois personagens principais, Light e L, de forma que, após a morte do L, o enfoque do detetive foi para Mello e Near, seus pupilos. Isso é um exemplo de Micropacing bem trabalhado, e que, visto as convicções dos dois personagens centrais, nos coloca presos na narrativa, esperando para ver o que acontece. Um exemplo de anime com Micropacing maltrabalhado é Boku no Hero Academia. Por mais que tenha seus charmes, o foco é nos personagens que, em sua maioria, são tão rasos quanto um pedaço de papelão. Se o Kouhei focasse mais no mundo de BNHA — que a falta de enfoque é um pecado que o autor insiste em cometer de novo e de novo — a história seria muito mais interessante, madura ou até mesmo sombria. Então, você deve estar se perguntando, como é que tanta gente gosta de BNHA. Simples. O autor soube manejar bem a dopamina no cérebro dos leitores. O sentimento de esforço de ler algo para depois recebermos a recompensa foi o que tornou essa obra tão popular. Para tal coisa, Kouhei usou da tensão narrativa, originada do conflito, para criar um sentimento de Hype em cada arco, que fazia o leitor, assim como um viciado, ler mais e mais, acreditando que o próximo vai ser diferente. Esse sentimento só é possível quando temos empatia com o personagem. Não teríamos interesse em personagens como Shoto Todoroki, por exemplo, se não fosse sua história triste e sua relação com o pai. Nós, como leitores, queremos ver a situação se resolver. É papel dos autores lidarem com esse sentimento de esforço e recompensa. Cada recompensa deve ser proporcional ao esforço que os leitores fizeram para chegar até ali. Por isso o Micro e Macropacing são tão importantes. Eles nos permitem alterar o foco e, dessa forma, controlar o quanto damos para o leitor e, mais importante ainda, quando o fazemos. Foreshadowing Agora que encerramos essa parte, passemos para a próxima. O que diabos é Foreshadowing? Bem, é a arte de introduzir um elemento desconexo numa cena e explorá-lo mais para frente, de forma que o leitor fique mais engajado na leitura e queira saber o que raios vai acontecer depois. Como eu falei antes, essa é uma ferramenta de controle da velocidade que o leitor percebe os arcos da obra. Anton Tchekov, autor da frase “mostre, não conte” (Temos um artigo sobre, basta clicar aqui), também desenvolveu um conceito interessante. A arma de Tchekov diz que todos os elementos de uma história devem ser necessários e que não se pode ter elementos desnecessários. Diminuindo isso para a escala de uma cena, quando colocamos um elemento deslocado numa cena, um que chama a atenção do leitor — mesmo que inconsciente —, estamos imediatamente preparando eventos futuros. O Foreshadow se faz necessário para o que eu falei de esforço e recompensa. Como ficcionistas, é nosso dever saber como manejar esse elemento e, ao mostrarmos uma irregularidade, algo que pareça desnecessário numa cena, temos a forma perfeita de como manejar isso. Se Pacing é a velocidade com que o leitor vira as páginas de um livro, esforço e recompensa estão diretamente relacionados com Pacing, e saber como expor irregularidades torna o controle dessa velocidade muito mais fácil. Se um personagem fala A, mas é conhecido por agir B, não só temos um hipócrita, mas também a possibilidade de explorarmos o porquê dessa mudança. Digamos que tal personagem seja um dos principais, um que já nos familiarizamos e conhecemos a forma como age e pensa, ver ele agindo de uma forma contrária a que estamos acostumados cria expectativa do que está havendo. Não apenas saber como introduzir irregularidades é importante, também temos o elemento de “quando” as introduzir. Dependendo de quando uma cena é posta na narrativa, tem-se impactos completamente diferentes. Quando conhecemos o par romântico Joel e vemos ele matar o irmão mais velho da protagonista Eduarda, sem nem saber do contexto dos dois, achamos apenas que o Joel é um desgraçado. Mas quando sabemos que um bruxo maldoso o chantageou para fazê-lo, ameaçando Eduarda com um feitiço que a mataria nos sonhos, temos um impacto completamente diferente. Na primeira situação, sentimos raiva de Joel logo de cara, ao ponto que apenas uma mudança completa na sua caracterização até aquele ponto o salvaria. Já na segunda, depende de quando as informações foram apresentadas. Se vemos a cena do bruxo ameaçando Joel antes dele matar o irmão de Eduarda, não sentimos nada além da raiva do bruxo, visto que aquilo já era esperado. Sim, podemos trabalhar o conflito interno de Joel em ter que fazer tal coisa, o que nos dá uma simpatia maior pelo personagem, mas se vemos as mesmas cenas, porém na ordem inversa, tudo muda. Não só temos o choque de que Joel é um traidor, nós sentimos a dor de Eduarda, que será bem trabalhada, e sentimos raiva de Joel… apenas para a mesma ser transferida para o bruxo depois que revelamos o que aconteceu. Mas, a essa altura, Eduarda já havia mandado um assassino cortar a cabeça de Joel, que vivia em outro reino, visto que era persona non grata onde vivia antes. Tudo muda se soubermos aonde e quando apresentar uma informação, e, por conta da resposta emocional diferente, o Pacing é alterado. Nós queremos ver como Eduarda vai lidar com o conhecimento que matou seu amado, que apenas tentava a proteger de um homem com ambições malignas. E, como na tragédia de Shakespear, nós apenas podemos sentir o desespero ao ver Eduarda pegar a mesma faca que foi usada para matar Joel e apunhalar sua jugular, deixando os últimos resquícios de sua vida miserável se esvaírem do seu corpo. Tudo enquanto o Bruxo toma o controle do reino. Bem, por hoje é só pessoal. Torço para a melhora individual de cada um de vocês e nos vemos no próximo post.
- Tipos de Roteiros
Produção dos Tipos de Roteiros na Escrita Muitas vezes se viu no servidor da Novel Brasil a grande questão da passagem de classe E para a D, que deveria ser feito um “miniroteiro” da obra. Mas que diabos é isso? Bem, galera, estou trazendo esse artigão para que todos, tutores, tutorandos e novatos da escrita, entendam as diferenças da escrita de enredo. Já deixo avisado que esse artigo é focado na informatização e didática a escritores de webnovels, então é aquilo: vai ser simplificado, omitido coisas desnecessárias, e resumido. Por mais que eu traga muita coisa, o aprofundamento de todo conteúdo não é o foco aqui. Logo, se você ficar interessado, vai atrás de mais, queridão. Curiosamente, o “tão-dito” roteiro é o único que um escritor não deve fazer — é, você vai entender ainda —, mas ignore por agora e vamos seguir as linhas de ações roteirísticas; da básica para a mais condensada. Para ajudar aqueles que têm interesse em se aprofundar nos conteúdos abordados, estarei deixando a versão inglesa do termo que estará sendo dito entre travessões ao lado — assim! —, uma vez que nossa língua costuma colocar tudo no mesmo saco de farinha. RASCUNHO VS ESBOÇO Então, uma vez avisado isso, vamos bater de frente com o postergado Rascunho — draft document — e onde ele se encaixa nesse mundão dos roteiros e até do famigerado Esboço — outline. Não estranhem o uso de letra maiúscula nos termos — capitalização. É um uso da informação para a fácil assimilação e reconhecimento da palavra e sua significação — é para você já bater o olho e não perder no texto —, mas se for usar normalmente, é com letra minúscula! Antes de tudo, o Esboço é algo tão grande quanto o Roteiro, no quesito de juntar um monte coisa dentro — compilação de microações/informações — dentro do que chamamos de conjunto. Só de ler a sua definição, já é fácil de entender: é um documento que inclui informações de planejamento importantes sobre a estrutura, o enredo, os personagens, as cenas de seu romance e muito mais. Muitos diriam que é muito parecido com o Roteiro nesse caso, porém não é. Já vi autores chamarem de “esqueleto da obra”, só que, como estamos colocando os verdadeiros ossos de uma história — o Roteiro —, o Esboço é na verdade o espírito da história. Um verdadeiro Roteiro segue padrões, estruturas e mídias em que é produzido e, principalmente, para o propósito final do que foi pensado. Enquanto isso, o Esboço pode ser qualquer coisa que dê o contorno — veja só, o outline surgindo de novo — da história, ajudando o autor em seu caminho definido e escrito, por exemplo: Pode ser um documento de uma ou mais páginas, compilando as suas ideias em um grande amontoado de informações que decidiu que será usado ou que já foi usado; Um mapa visual que utiliza de imagens, referências e até diagramas que usa linhas para a ligação das informações e ideias que foram determinadas; Como pôde perceber, os verbos definir, decidir e determinar foram escolhidos para que você fosse levado a entender que o Esboço é algo que vem após ideias e informações serem selecionadas e aceitas para serem implementadas na história — algo que pode acontecer durante, antes ou depois do roteiro. E quando eu digo que pode acontecer após terminar, significa que os autores usam o contorno da história como um guia supercondensado dos pontos mais importantes que precisa lembrar, sem a necessidade de olhar o universalmente gigantesco e mastodôntico roteirão. Já que pode ser simplesmente: Um documento com algumas páginas da estruturação de cada cena — scene — já concretizada no seu enredo, para a fácil revisão de informação mental. Claro, há quem diga que o Esboço possui regras, assim como tudo na vida, já que precisa de organização e blá-blá-blás. Se quiser aprender os diferentes tipos de Esboços e suas regrinhas, vá atrás, mas já aviso que: Já que é um documento que só será visto por você, não há necessidade de bater a cabeça para seguir moldes e modelos. Faça da forma que fica mais agradável para a sua sintetização de elementos e compreensão. Uma vez entendendo que Esboço fica, muitas vezes, à parte do próprio Roteiro e é uma execução própria, com suas características únicas, o Rascunho já é um pouco diferente. Ele, por ser muito parecido com o próprio Esboço, é um passo muito importante para o Roteiro, então, digamos que ele é um elemento fundamental em ambos. Rascunhos são a história, mas que normalmente possuem diferentes versões. Na escrita, o Rascunho é a primeira coisa que você deveria escrever, e conforme mais ideias surgem... maior, mais arquivos e mais bagunçado começa a ficar. Como eu já disse antes, muitas pessoas costumam colocar regras, padrões e por aí vai em tudo o que fala da escrita. Para a simplificação sobre o que é um, vou abordar de cara o Rascunho Inicial/Bruto — first draft ou rough draft. Em primeiro lugar, o Rascunho Inicial é a raiz da sua história. Ela é a própria definição do que se trata sua obra, podendo ser apenas um emaranhado de ideias fundamentais que compõe sua primeira visão do que vai se passar dentro da trama. É algo tão liberto e fora das palavras que muitos autores optam por desenhar, jogar citações nas margens das páginas e apenas escrever o que compõe como principal da sua ideia. Claro, se você fizer um roteiro e for fazer um rascunho do capítulo 1, esse será o Rascunho Inicial, nada condizente com o que eu falei agora sobre o Rascunho Bruto da trama. Para entender melhor, preparei alguns exemplos rápidos de Rascunhos. Lembre-se que são exemplos rápidos, então você não precisa fazer nos mesmos moldes. Rascunho Informativo Para esse tipo, basta focar em um dos elementos da história — personagens, cenários... — e escrever o que é importante sobre isso. Deve-se compilar as informações que aparecerão uma hora na obra — não precisa ser nem no começo da história e nem do jeito que escreveu. O Antagonista Uma criatura ancestral que planeja salvar o mundo, utilizando métodos deturpados. Controla uma praga que se espalha entre os humanos. Rascunho Citação É o que busca trazer o teor e pensamento que determinam o tom da narrativa, pensamento dos personagens e o que se trata o tema da obra. São frases que podem surgir na obra como uma versão adaptada, ou mesmo para serem subentendidas pelo leitor através do que é mostrado. A Arte da Guerra – Sun Tzu “O general deve criar situações favoráveis e tirar proveito de qualquer vantagem.” “Ataque o adversário quando ele está em desordem. Estimule sua arrogância simulando fraqueza.” Crepúsculo dos Ídolos – Friedrich Nietzsche “Raras vezes se incorre numa só precipitação. Na primeira vai-se sempre longe de mais. Precisamente por isso se costuma incorrer logo numa segunda - e desta vez fica-se demasiado perto...” Rascunho Direcionado Normalmente tende a resumir um determinado capítulo, cena, conflito e por aí vai, da história. É o que muitos autores jardineiros utilizam para ter uma base mais firme em sua construção de cenas. É para ser uma direção — um norte — na escrita ou um ponto fixo da história. O Conflito Um programador famoso convoca seu amigo de infância, um detetive renomado, para investigar o assassinato de seu pai. Não demoram em descobrir que a inteligência artificial que automatizava a casa da vítima é a culpada do crime. No fim, o detetive é traído pelo programador, sendo revelado que todo o seu esforço em identificar um culpado e desligar a IA era apenas uma demonstração do seu novo sistema de vírus computacional, que será vendido ao governo que pagar mais. Como dito antes, é tudo Rascunho Bruto/Inicial, logo são curtos e rápidos. No entanto, uma vez que for tendo mais ideias, maior fica esse documento e pode surgir até outros rascunhos diferentes. Um bom Rascunho, quando finalizado em seu polimento, é o que chamamos como organizador. Ele lista desde as ideias primordiais que vociferam os valores dos personagens, a forma da narrativa, a mensagem das cenas e objetivo da finalização da obra. Como deu para ver, o Rascunho faz parte tanto do Roteiro quanto do Esboço, dando um extra de informações fora do contexto “regrinha chata para se seguir”. É engraçado que, na escrita brasileira, o Rascunho é conhecido como Manuscrito — manuscript — claro, o antigo pelo menos. O novo Manuscrito, chamado de Manuscrito Editorial, é para editoração, por isso, por mais que procure sobre o conteúdo em português, só verá informações de regras e padrões a se seguir para encantar uma editora com apenas um Manuscrito — que nem deveria mais ter esse “manus” no nome, hein. Eu não vou falar sobre Manuscritos porque seria uma informação desnecessária para nós, escritores de webnovel, por mais que o Rascunho tenha sido jogado dentro disso e postergado pela escrita brasileira por causa dessa encheção de regras das editoras. Porém vou pegar emprestado do artigo do Projeto Escrita Criativa dois exemplos dos Manuscritos Pessoais, esses que são das antigas e que definem exatamente o Rascunho — sim, podemos chamar tanto de Rascunho ou de Manuscrito Pessoal para definir essa organização de elementos. Honoré de Balzac, 1799-1850 “Esta página é pertence ao texto Eugénie Grandet, um dos primeiros grandes romances de Balzac. Como é possível observar, Balzac riscava em preto as partes que considerava dispensáveis de um texto datilografado e anotava nas bordas as principais mudanças e pontos de atenção.” Mark Twain, 1835-1910 Para finalizar essa luta ferrenha, vou fazer uma definição rápida da minha visão sobre o que abordei aqui. Esboço é o que eu chamaria de Enredo Supercondensado. Já o Rascunho, ou Manuscrito Pessoal, eu daria o nome de Layout da História. Sim, eu consegui resumir todo esse textão com essas duas frases. De nada. Argumento e Escaleta Agora que fugimos da complicação da escrita brasileira e a inglesa, vamos finalmente chegar em coisas conhecidas na nossa linguagem e que devíamos fazer para facilitar a produção da nossa obra. Vamos começar com o Argumento, que possui muitas características parecidas com a sinopse editorial. Aliás, se você não sabe o que é uma sinopse editorial, segue esse link e confere antes de continuar a ler aqui. A diferença de uma sinopse editorial para um Argumento é a densidade informativa de dados que serão abordados no documento. No caso da sinopse editorial, não confundir com a de cópia/convencional, você tem a necessidade de dar contexto do mundo, dos personagens, das características que serão colocadas dependendo do momento, além de ter o objetivo de prender o agente de editora com detalhes importantes ou mínimos: explicar cada personagem, o motivo de se interessar em certas partes, dificuldades e por aí vai. Querendo ou não, a sinopse editorial acaba entrando muito dentro de detalhes menores, mas costuma passar de 4-5 páginas para descrever as cenas e arcos narrativos. Agora, sobre o Argumento, seu único e fiel foco é a descrição de cenas e o entrelaçamento dos arcos, do início ao final da obra. Diferente de uma sinopse, tanto a editorial quanto as convencionais, o Argumento não tem um tamanho definido, podendo ter muitas páginas. Sua principal função é a orientação das ações tomadas dentro da obra. É o Argumento que acaba por facilitar toda a vida dos escritores, já que ele decupa e é capaz de reduzir um roteiro de algumas dezenas de páginas para menos de uma dezena. Para um escritor esse é o melhor tipo de roteiro que pode encontrar, já que seu foco é cobrir cada cena em uma linha ou parágrafo. A ideia é apenas sintetizar — lembre-se dessa palavra — cada ação como um ponto e interligar entre cada passagem que for escrever. Claro, para quem nunca fez um, deve ser complicado imaginar, mas com um exemplo prático, aposto que vai entender rapidinho e querer fazer. Argumento Vou estar utilizando a história “O Horror de Portsworth” de exemplo para o Argumento. Exemplo 1 Um grupo de aventureiros genérico é convocado para salvar um vilarejo em apuros. Chegando ao local, a equipe decide se dividir para encontrar pistas. Enquanto uma parte dos protagonistas é confrontada por aldeões sanguinários, a outra descobre que uma energia maligna se concentra no interior de um moinho. Quando os camponeses insanos são derrotados, o grupo se reúne novamente para adentrar a construção misteriosa. Deparam-se com uma caverna no interior do moinho, que os leva a um mundo onde as cores, os sentimentos e o próprio tempo funcionam de formas inconcebíveis. Os protagonistas enlouquecem, morrendo um a um. No fim, apenas o mago Keiniz consegue escapar do túnel, apenas para descobrir que está servindo de casca para que a entidade do moinho possa explorar o mundo. Exemplo 2 Arco 1: O Mundo Comum Elizel e Lidja discutem sobre o futuro do rapaz como herdeiro do título da família e sobre o rapaz com a cicatriz ainda não estar pronto para ir ao Craveiro. Morfeus e Angela entram em cena, o mordomo com o rosto assustado. Na próxima cena, Morfeus volta para falar com Elizel com a noticia que o rapaz havia ateado fogo em seu próprio quarto. Diego vai até o encontro dos três valentões do beco, rapazes quatro anos mais velhos que o protagonista e já envolvidos com roubo, para trocar o isqueiro roubado por ingressos do cinema. Então o rapaz é enganado pelos três. Furioso entra em uma briga e quebra o braço de um rapaz, a perna de outro e quase arranca a orelha do último. Pegando o dinheiro dos rapazes, ele vai até ao cinema e assiste Gladiador, onde vê sobre o uso da força e a importância de se ter amigos de guerra. Elizel chega no cinema e o carrega até em casa de volta, alegando uma conversa seria, apresentando o que Diego acha ser um pote de veneno. Nota: feito especificamente para mostrar ação na história. Escaleta Você consegue ver que o Argumento busca resumir o foco dos capítulos em uma linha e interliga como se o próprio Argumento fosse uma história rápida, apenas por evidenciar as partes cruciais da história. Neste caso, como se cada frase fosse um capítulo da obra. Dessa forma, finalizamos o queridíssimo Argumento e podemos finalmente falar do Santo Graal dos roteiros para escritores: a Escaleta. Como esse é um ponto muito importante, recomendo que, após ler o artigo, vão atrás de aprender mais sobre a Escaleta. Como é um conteúdo de acesso fácil, vocês vão encontrar bastante coisa sobre isso. Enfim, vou explicar o motivo de ser tão importante para um escritor na atualidade. Observe que eu usei o tempo todo escritor nesse artigo e nunca um “escritor de roteiro / roteirista”, porque é MUITO DIFERENTE. Ou seja, a Escaleta é o último passo para escrever o enredo de uma ficção literária. Dizem que o autor utiliza o Argumento para contar o que acontece na sua história, do início ao fim. Se este for o caso, então a Escaleta nos mostra como os acontecimentos ocorrem. Aposto que agora entendem melhor o que isso quer dizer, né? Para se construir uma Escaleta, deve-se analisar cada capítulo de sua obra, criando um esqueleto do enredo, que servirá para impedir que o autor se perca na magnitude de sua história. Para exemplificar como se monta uma Escaleta, vou estar usando três exemplos de tipos de sintetização de enredo para que você opte por um dos próprios entendimentos que precisa ter quando ler a sua Escaleta. Exemplo 1 Capítulo 11: Bandidos na Estrada Local: no meio da floresta, próximo a linha férrea Contexto: após sobreviverem ao ataque no quilombo, o grupo precisa seguir até a capital Ponto de vista: o grupo principal está unido, então os pensamentos e ações terão ênfase no protagonista — Lucas Guerra. Personagens envolvidos: Lucas, Arthur, Sophia, Aren, Anahí e um grupo de bandidos, liderados por um cafetão chamado Flávio Curtus. Ações dos personagens: Arthur revelará mais alguns detalhes sobre a magia, ao acender uma fogueira e dizer algumas coisas para outro integrante do grupo. / Sophia irá conter os bandidos, praticamente sozinha, com seu poder que envolve fios de energia. Outros elementos importantes: Esse capítulo irá começar a transição de mentalidade de Lucas, dando as primeiras informações que contradizem suas crenças. 1. Deve listar todas as cenas (local, situação em pov). 2. Deve listar os personagens envolvidos. 3. Deve listar ações dos personagens de forma direta. 4. Deve listar outros elementos importantes da história. Exemplo vindo da obra Guerra, o Legado no Sangue. Exemplo 2 Capítulo 1 – Um Acidente Kurono é um adolescente tarado e egoísta. Quando está no metrô, percebe que seu colega. Katou saltou nos trilhos para salvar um morador de rua. Diante dos pedidos de socorro do amigo de infância, ele decide dar uma de herói. Os dois são atropelados por um trem, enquanto o indigente é salvo pelos civis do metrô. Quando tudo parecia perdido, eles despertam em um apartamento comum, junto de outras pessoas que morreram recentemente. Capítulo 2 – Uma Sala Inexplicável Dentro do apartamento, os recém-mortos são apresentados a uma esfera negra conhecida como Gantz. Essa tecnologia misteriosa lhes avisa que suas vidas terminaram e agora devem cumprir uma missão para recuperar suas liberdades. São obrigados a matar o temido alien Cebolinha. Exemplo 3 Explicação de onde vem os poderes e apresentação do protagonista (Leonardo) indo realizar o teste; — Capítulo 1 Conhecer a segunda principal (Charlotte) e se deparar com um resultado ruim do teste; — Capítulo 2 Ativação do poder; — Capítulo 3 Como pôde ver, as Escaletas têm níveis de complexidade e sintetização, mas nenhuma “formatação” que deva ser seguida, afinal é algo que só você verá mesmo. E, sim, eu mostrei a Escaleta de Venante e ela é tão sintetizada quanto os meus parágrafos da própria obra, para me lembrar como devo escrever. Quando eu digo níveis de sintetização, significa a quantidade de informações para que nós, escritores, para lembrarmos das informações que serão abordadas dentro daquele capítulo. Então, vendo o que melhor considera, opte por seguir e transformar para que fique ainda mais acessível e compreensível por você. A ideia é a facilitação! Antes de tocar no tópico do Roteiro, queria avisar que deixei de fora a parte da Bíblia aqui, que é outro produto de enredo que pode ser feito. Assim, se quiserem pesquisar sobre, sintam-se à vontade. Enfim, é hora de dizer que... Escrever Roteiro é Desnecessário Calma lá, calma lá! Não levantem com raiva antes de ler o finalzinho! Acabei de explicar tanto de roteiro e acha que vou descartar tudo só com esse título? Agora que vocês estão cientes do que é útil na escrita de uma ficção, tá na hora de desmistificar o tal “escrevo roteiro” que muitos usam e não percebem a gafe que é. Bem, é óbvio o motivo de isso acontecer... esses nem fazem ideia do que é um roteiro no fim das contas. No Guia de Worldbuilding que eu escrevi — recomendo que leia — é dito: Um dos maiores problemas de um arquiteto é trabalhar demais em algo e não produzir uma história soltinha. Isso porque é tanto esforço colocado no roteiro que se esquece do sentido da escrita, de dar vida aos personagens, deixá-los tomar suas decisões próprias, mas não tomar a decisão por eles, só porque definiu isso! Histórias onde o escritor arquiteto dedicou todo seu esforço em seguir seu molde são as piores: duras e anêmicas. É quase forçar seus personagens a seguirem seus passos erráticos porque não sabia como seriam antes de criá-los em suas páginas. O motivo disso? É simples, o exagero de esforço colocado em algo desnecessário para a escrita criativa e a escrita de enredo. Sim, não de roteiro, mas de enredo! Roteiro necessita de diálogo, diálogos para um caralho! Você precisa pensar em câmera, em cena vindo de jeito x e jeito y — não que todo roteirista pense nisso também — como isso complementa no posicionamento e pensamento da produção de UM FILME/SÉRIE! Não um livro! Sabe o que acontece quando escrevemos os diálogos de um personagem num documento que é feito para listar enredo? É exatamente o que é dito no worldbuilding: a história fica dura e anêmica. O motivo? É simples: Todo escritor tem o sentido da escrita. É aquela sensaçãozinha quando escrevemos algo e parece que novas ideias surgem — correções, mudanças na trama e atitudes diferentes dos personagens; Agora, se seguir um roteiro definido e só meter cada diálogo criado e as interações dos personagens que só pensou como seria, é a mesma coisa que usar a carcaça, algo morto, para fingir que está falando. O personagem não tem vida, porque é só quando ouvimos a escrita falar conosco que algo ganha vida e para de ser mecânico. É por este motivo que a Escaleta é tão importante para um escritor. Porque ela descreve com os detalhes que você escolheu para representar o enredo. Se você fizer até os diálogos para facilitar o teu trabalho, você vai estar fazendo algo desnecessário e sem propósito — uma perda de tempo, no fim das contas. Acompanhe os motivos do Roteiro ser desnecessário para escritores de ficção literária: Vai ter que reescrever os mesmos diálogos nos capítulos; Se não escutar o que a escrita fala contigo, você vai só evidenciar personagens duros e sem alma Se escutar, vai ter que reestruturar todo o roteiro, de novo e de novo; Não tem motivo para pensar em câmeras; Não existe o uso de técnica cinematográfica dentro da ficção literária; Vai ser uma perda de tempo para a inicialização do seu primeiro capítulo; Trabalho em dobro para aplicação da mesma coisa, isso se não contar as mudanças que acontecerão conforme escreve. Claro, o uso de “roteiro” para definir o argumento, escaleta, manuscrito, rascunho e outros é liberado, já que muitas pessoas nem entendem o que exatamente é “enredo”. Mas não escreva um roteiro como escritor! A ideia do artigo aqui é libertar esse vício de falar que tudo é roteiro, saber os nomes corretos de cada separação dentro do conteúdo dos roteiristas e entender o que é necessário na escrita. Reconhecer a ignorância e buscar a informação é algo essencial nos escritores, então espero que todos tenham entendido e saiam daqui com novos insights da construção dos seus enredos.
- Guia de Worldbuilding
Worldbuilding O que é Worldbuilding? Construção de mundo, ou worldbuilding para os "gringolas", não é um assunto leviano para escritores. Na verdade, é a essência de uma boa história de fantasia ou sci-fi; aquilo que convida os leitores para um outro mundo e faz sentirem saudades de um lugar que nunca estiveram. É um termo que você deve ter escutado muito de outros escritores mais experientes — por exemplo aqueles que escrevem os gêneros já citados acima. No entanto, para os autores novatos, que nunca escutaram na vida antes, este famigerado worldbuilding é um desafio esmagador a se enfrentar. No fim, worldbuilding é o processo de criação de um mundo fictício dentro da sua história que introduzirá novas e únicas criaturas, sociedades, religiões, governos e por aí vai. É o que dá uma compreensão clara de como é o seu mundo. Este mundo serve para estabelecer onde a obra se passa, além de ancorar o leitor na história, não o deixando perdido nos passos dos personagens e mudanças do cenário. A criação de mundo é uma chance de capturar a imaginação do leitor. Uma vez imerso no que você criou, esse leitor será capaz de suspender a descrença e se envolver totalmente com a estrutura da história para desfrutar de uma experiência completa, por mais maluco que possa parecer o seu universo. Por Que Fazer? Um bom worldbuilding torna seu mundo ficcional plausível e imersivo para o leitor. É um processo fundamental para o autor que pretende criar um mundo muito diferente do nosso. E por quê? Porque o leitor será deslocado para um ambiente pouco familiar. Tornar esse mundo crível, como se realmente pudesse existir, fará o leitor mergulhar de cabeça em sua história. Cuidado! Worldbuilding não significa criar um mundo completamente lógico e racional! Muitos autores renomados e famosos ficaram conhecidos por seus mundos absurdos Terry Pretchett: criador da saga Discworld, uma terra plana sustentada por quatro elefantes em cima de uma tartaruga que voa eternamente pelo cosmo. Doublas Adams: criador do Guia dos Mochileiros das Galáxias. Portanto, worldbuilding significa dar vida ao mundo, tornando-o coerente com o tipo de história a ser contada. Tipos de Escritores Para entender melhor uma abordagem que você deve tomar, primeiro procure saber que tipo de escritor você é quando se trata de construir um mundo: Um jardineiro/pantser ou um plotter/planner/arquiteto, há também o meio-termo, o plantser, este último não faço ideia de qual seria a melhor nomeação no contexto da escrita portuguesa, mas chamarei de pedreiro. Começamos pelo escritor arquiteto: “Os arquitetos planejam tudo antes do tempo, como um arquiteto constrói uma casa. Eles sabem quantos aposentos a casa terá, que tipo de telhado terá, onde os fios estarão passando, que tipo de encanamento terá… Eles têm a coisa toda projetada e desenhada antes mesmo de pregarem a primeira tábua.” Num breve resumo, um arquiteto, ou plotter/planner, é aquele escritor que se dedica totalmente ao roteiro... O tipo que delineia seus enredos, elabora descrições detalhadas de personagens, criam cenários complexos. Que, antes mesmo de começar a fazer o primeiro capítulo, ele já tem explicação na ponta do lápis para toda e qualquer coisa que aparecerão na trama. Já um jardineiro, como George R. R. Martin, autor de Game of Thrones, explicou: “Os jardineiros cavam um buraco, jogam uma semente e regam. Eles meio que sabem que tipo de semente é; eles sabem se plantaram uma semente de fantasia ou uma semente de mistério ou o que quer que seja. Mas conforme eles regam e a planta cresce, eles não sabem quantos ramos ela terá, eles descobrem isso conforme ela cresce. Eu sou muito mais um jardineiro do que um arquiteto.” Pantser, ou jardineiro, é o escritor instintivo. Aquele que começa sua história com uma simples frase ou ideia presa na cabeça e desenvolve o capítulo no improviso; muito mais interessados em passar uma divertida história, e só depois de finalizar corrige os problemas dela. Então chegamos no ponto importante, principalmente nas webnovels, o pedreiro. Seguimos uma filosofia básica de que o esforço deve ser medido conforme a recompensa já mediada por si mesmo. Não adianta você fazer a obra da sua vida se for esquecida por todos, muito menos um trabalho cheio de furos e estragar a experiência de centenas de leitores, tendo que interromper a obra no processo da criação. Um dos maiores problemas de um arquiteto é trabalhar demais em algo e não produzir uma história soltinha. Isso porque é tanto esforço colocado no roteiro que se esquece do sentido da escrita, de dar vida aos personagens, deixá-los tomar suas decisões próprias, mas não tomar a decisão por eles, só porque definiu isso! Histórias onde o escritor arquiteto dedicou todo seu esforço em seguir seu molde são as piores: duras e anêmicas. É quase forçar seus personagens a seguirem seus passos erráticos porque não sabia como seriam antes de criá-los em suas páginas. Já do outro lado, um dos maiores problemas de um jardineiro é o furo de roteiro e falta de peso no enredo principal. Afinal, esse tipo de escritor é aquele que inicia com uma ideia supersimples ou que acredita ser mirabolante, criando um universo fraco de regras e personagens pouco desenvolvidos previamente. A partir daí é que falamos de um bom pedreiro. Planeja uma base firme, normalmente é uma sinopse, subenredos e arcos de personagens, o suficiente para começar a “construir” no papel. Com isso é que começa a improvisar, ou, como chamamos, “criar gambiarras”, em cima do próprio roteiro, sem esquecer das regras previamente feitas, além de deixar que seus personagens tomem seus caminhos através do momento que está escrevendo. É o que cria as melhores histórias de webnovel. Afinal, ele não demora para planejar e também improvisa conforme escreve o que estabeleceu! Sendo um bom pedreiro, você não se atém a um final próximo para focar na sua próxima história nem interrompe no início porque tá cheio de furos por seus improvisos, mas consegue prolongar o quanto quiser, igual autores chineses. Claro, há pontos ruins, como reutilização de passos da jornada do herói para prolongar certos arcos, ou a tendência de pender mais para um tipo do que outro — nunca sendo 100% pedreiro — e isso acaba por puxar mais problemas na execução. No final, não há jeito certo ou errado de construir um mundo. Todos têm suas maneiras e decisões; basta ver como você prefere fazer isso e o que quer mostrar ao leitor. Mas, e aí, descobriu que tipo de escritor você é? Agora bora falar sobre worldbuilding de novel, e olha que temos o que falar, dependendo do seu tipo de escrita. Tipos de Mundos Para facilitar a organização deste guia, estarei abordando os três principais tipos de mundo brevemente, apresentando questões simples que você precisa ter em mente em cima dos três e, só depois disso, entrando em cada um tipos para falar mais amplamente. Localidade Real: A invocação de um lugar real no mundo — muito utilizada em histórias sem elementos fantásticos. Realidade Alternativa: Aquele que reimagina detalhes do nosso mundo; popular em ficção científica. Mundo Imaginário: É o tipo inteiramente fictício, visto MUITO em obras de fantasia. Com essa linha de progressão, temos que pensar em como abordar dentro da nossa história: Aparência, habitantes, história, regras, religião. Perguntas para Worldbuilding Vamos pela aparência, pense comigo, é através da fisicalidade crível que o leitor terá um chão para acompanhar a história. Com isso em mente, reflita: A história vai se tratar em uma área pequena ou vai progredir para diversos outros ambientes/locais? O quanto do seu mundo você precisa mostrar aos leitores para dar apoio a todo enredo que vão acompanhar? Como os terrenos infuenciam no enredo Só para você ter ideia, você detalhar a paisagem de um local é motivo para se preocupar com o transporte e roupas das pessoas! Há muitas outras perguntas para se encaminhar no sentido físico da construção de mundo antes mesmo de fazer um capítulo, mas seremos brandos para não passar informação demais, então deixaremos por estas neste tópico. Em seguida, vemos os habitantes, ou seja, pessoas, aquelas personagens que moverão a trama e verão outros semelhantes ou diferentes de si. São humanos, híbridos, alienígenas ou algo muito diferente? Como é a população na sua história? Como eles fazem parte desse mundo? Há algum sistema de classes entre os seres? Se sim, como ele funciona e surgiu? Quantas raças, espécies e gêneros existem? A idade influencia em algo nisso? Há conflitos, inimizades, amizades ou alianças entre grupos específicos? Se sim, como isso surgiu? A história é importante, já que conta como as coisas surgiram e porque são daquele jeito na atualidade. Embora não seja necessário saber cada detalhe, é crucial passar ao leitor a sensação de realidade e pertencimento, que agora é também uma pessoa que tá vivendo aquele evento X. Quem e quais foram os mais importantes regentes? Que eventos importantes marcaram durante seus tempos e como isso aparece na história? O que essas pessoas foram capazes de mudar quando vivos? Como os países ou reinos chegaram ao estado em que se encontram na atualidade? Existe algum evento histórico digno para ser citado e lembrado? Quais são os eventos históricos religiosos e políticos que impactaram no enredo? Quais foram os maiores desastres? Fome, praga, inundação ou a natureza feroz? Como isso impactou a terra e as pessoas? Aconteceram guerras? Ainda acontecem? E por quais motivos? Sem dúvidas, a história é uma das partes mais instáveis de se trabalhar. No entanto, um autor, que sabe o passado da sua história, é capaz de trazer incríveis foreshadowings e reviravoltas na trama. Então, chegamos no penúltimo tópico: regras. Toda sociedade possui regras e condutas; um comportamento que espera ser seguido. Ter regras dará uma compreensão das ações e reações dos personagens, bem como demonstrar o pregresso de desenvolvimento deles. Então, questione-se: Qual é a estrutura política do mundo? Quem detém poder, influência ou autoridade? É um indivíduo ou grupo? É totalitarista, autoritarista ou democrata? Os personagens vão quebrar ou contornar as regras, ou serão eles que as administrarão? As regras são consideradas justas e corretas, ou a sociedade em geral está frustrada como elas são impostas? Que tipo de punição sofre as pessoas que quebram essas regras? Por fim, chegamos na religião. A religião pode se dividir e também abordar os costumes. Em mundos alternativos e imaginários, críticos e leitores desaprovam mundos sem novidades do próprio autor. O incômodo surge justo em apenas uma raça de pessoa, já que, ao criar uma sociedade, há variação de habitantes, o que implica diferença cultural. Um mundo bem desenvolvido terá até feriados nacionais e religiosos, roupas e culinárias diferentes, até sotaques! Qual é o sistema de crença religiosa? Que deuses, se houver, existem? Essas divindades desempenham um papel tangível e ativo no mundo ou são entidades em que as pessoas acreditam? Quanto a religião desempenha na vida diária das pessoas? O que é considerado sagrado? As pessoas reverenciam para isso? Existe rituais ou costumes relacionados à religião da sua obra? Existe disputas entre religiões diferentes? Por qual motivo? Feriados acontecem com que frequência e por quais motivos? Como funcionam as famílias, casamentos e outros relacionamentos? A morte é tratada de que jeito? Há algum serviço religioso prestado neste momento? Tem motivo para as pessoas chorarem? Reprodução é feita por amor ou dever? As pessoas podem escolher seus parceiros? O que é considerado impróprio e imoral? Por mais que tenha muitas perguntas nessa parte, são algumas das mais importantes, afinal essas têm o poder de moldar motivos, sociedades e personagens por completo. E mesmo se você decidir criar uma sociedade monolítica — onde todos são da mesma raça/religião — ainda precisa mostrar com clareza quais são os costumes exclusivos do seu mundo. Métodos de Worldbuilding Antes de começarmos a entrar de cabeça nesses tipos de mundos, vamos falar sobre como escrevê-los. Você sabia que há duas formas — bem, há mais, mas essas duas são as mais conhecidas — de introduzir seu mundo ao leitor? Os métodos inside-out e outside-in — respectivamente, de dentro para fora e de fora para dentro. O primeiro é aquele que já deixa claro que tem um ponto de história definido, assim, já vai construindo a partir dali. Leve como exemplo: o protagonista consegue controlar algum elemento. Logo, começaríamos por entender como o poder funciona, mostrando os limites, consequências, compreendendo como é visto pelas pessoas, se é comum ou incomum, impacta na cultura, economia, etc. Com o inside-out, o foco e o que mais será trabalhado em detalhes são pontos chaves escolhidos para começar a construção; são eles que ditarão o resto. Enquanto o segundo, começamos por construir a geografia do mundo, entendendo o território e suas fronteiras. Em seguida, seguimos fechando o foco, indo dos aspectos geográficos para os países, os governos, a cultura e os folclores. Ou seja, o outside-in é para um mundo mais "completo" do que o inside-out, em que geralmente o universo criado está mais finalizado quando se começa a pensar em personagens e narrativas para serem inseridas nele. Localidade Real Definido isso bonitinho, tá na hora de falarmos do local real. Começamos por este porque a ficção ainda precisa de uma base da realidade para que possamos transformá-la nos outros dois tipos de mundo. Localidade real, mundo real ou local real é o tipo de worldbuilding onde são trabalhadas obras históricas ou que querem zero elementos fantasiosos ou alternativos, e sim a mais verídica ambientação. Imagine que está escrevendo uma história e você decide que será no seu país/estado/cidade/bairro/rua. Você terá um local cada vez mais real da sua vida e que transmitirá a pura vivacidade de alguém viveu nesse lugar. Agora, para tornar um pouco mais difícil, e se você mudasse apenas o tempo que se passa? Voltar 50/80/100 anos no lugar. Uma história de localidade real respeita os acontecimentos que quer retratar, já que o worldbuilding dela busca trazer a mais pura autenticidade do lugar. Muitos autores percebem através desse tipo de construção de mundo a dificuldade em trazer à tona a realidade para os leitores. Como trabalhar uma história inteira que se passa em um só bairro na visão de uma criança? E se esse bairro fosse nos anos 60? Como apresentar ao leitor detalhes ao longo da obra para que não seja sobrecarregado com informações inúteis? E nós sabemos que é um pouco curioso chamarmos de construção de mundo para algo que já está criado, mas a parte “construção” não é apenas para fazer algo, mas introduzir algo do início ao fim para que o leitor construa o que é tão importante nas histórias: criação senso de lugar. Em nenhum worldbuilding basta apenas deixar o narrador explicar tudo ou os personagens verem algo. Precisa fazer o leitor imaginar e sentir. Usar o tato para tocar as barras enferrujadas da cadeia que há muito não eram trocadas naquela cela mal iluminada pelo sol escaldante do sertão, o paladar para saborear os toques apimentado dos condimentos que a dona Lakshmi coloca em sua culinária indiana, a audição para escutar a chuva pesada que há tanto atormentava a lavoura da pequena cidade agrícola, a visão para ver a verdade por trás das promessas políticas de um país cada vez menos consciente, e o olfato para cheirar o nostálgico perfume de gardênia que permeava as ruas de sua velha terra, tão importante que estampava a bandeira do munícipio. É através da criação de senso de lugar que cada sentimento trazido pelos personagens ou narrador é entendido pelo leitor que, por fim, é capaz de imaginar e sentir em si. Usar os sentidos é a forma mais rica e esperta que um bom worldbuilder é capaz de mostrar seu mundo de maneira crível. Exemplos de Histórias com Worldbuilding de Localidade Real: Aqui podemos colocar as mais diversas obras, desde o romance que passava na sessão da tarde todo dia, contando o desenvolvimento amoroso de duas pessoas, até as séries de cómedia da nickelodeon como: ICarly, Kenan e Kel ou Drake e Josh. Também podemos citar animes/novels como classroom of the elite (Yōkoso Jitsuryoku Shijō Shugi no Kyōshitsu e) ou Horimiya. Apenas o nosso mundo comum, aquele que estamos acostumados. Realidade Alternativa Com uma base realista, está na hora de trocarmos alguns aspectos da nossa história, fugindo do mundano! É a hora de mudar, ou melhor, alternar. Uma realidade alternativa. Aqui é uma terra do “e se”, o famoso “what if”, onde coisas minúsculas podem causar uma distorção histórica absurda ou mesmo apenas velar coisas reais em cima de elementos fictícios. Quando criamos uma realidade alternativa, estamos desenvolvendo uma versão diferente da nossa própria Terra — imaginando como as coisas poderiam ser diferentes e colocando questões sobre o que essas diferenças significariam para a humanidade. É muito comum vermos esse tipo de mundo em ficção distópica, especulativa e científica. Principalmente porque os autores expressam seus pensamentos sobre as falhas da humanidade e do mundo atual nesse estilo de escrita, explorando as consequências que tais falhas podem produzir. Considere o “e se” agora, “e se os Aliados perdessem a Segunda Guerra Mundial”, com apenas isso em mente, Philip K. Dick conseguiu produzir “The Man in the High Castle”, uma realidade onde a Alemanha e Japão ganharam a Segunda Guerra Mundial. Uma hora que estamos nessa realidade alternativa, é importante perceber que há uma linha tênue entre ficção histórica e fantasia. Como o próximo tipo de mundo é a respeito a fantasia pura, darei um exemplo básico do que é fantasia e ficção histórica. O autor de Game of Thrones usa uma versão velada da Guerra das Rosas e passa a inserir dragões, zumbis e reis loucos. Veja como esses aspectos — por mais que utilize uma história da vida real — ainda são fantasiosos. Além disso, para trabalharmos em uma realidade alternativa, não podemos perder a mão para detalhes cruciais de uma situação crível para todos leitores, do contrário, acabaremos fazendo um mundo imaginário. Para que um leitor se sinta confortável com uma realidade alternativa, precisamos entregar elementos fáceis de entender que é como o nosso, mas levemente diferente. Não seja o tipo de autor que apenas copia e cola arquétipos ou rouba de culturas sem alterar as coisas. Desenvolver uma cultura credível é a forma correta de apresentar ao leitor o seu mundo alternativo. Especule sobre como uma cultura pode mudar de forma realista ao longo do tempo. Pegue por exemplo o simples fato de a Espanha ter conseguido verdadeiramente dominar toda a América. Como isso implicaria no atual momento? A língua falada também é um reflexo das culturas que a gerou, e a evolução da língua indicará alguma mudança social. Basta ver em Laranja Mecânica, o autor criou o “nadsat” que é um vocabulário que mistura o russo e inglês. Isso implica muito no mundo distópico do livro, já que sugere um futuro onde a cultura soviética se espalhou muito mais para o Ocidente. Na Realidade Alternativa, um dos assuntos mais problemáticos a se comentar: ciência. Nesse tipo de worldbuilding é muito comum a ficção científica. Você conhece o termo Hard Science? Ou como vou chamar: ciência de otário. São aquelas histórias com embasamento científico pra caralho. Tipo o “2001: Uma Odisséia no Espaço”. São aquelas histórias jogarão fatos e mais fatos da tecnologia e ciência para o leitor. Logo, se sua história vai ser focada no quão fodão você é na ciência de otário, faça o mínimo e acerte os fatos que estará trabalhando com a ciência técnica e tecnologia do seu mundo alternativo. Lembrando que não há necessidade de focar na ciência ou magia — caso o foco não seja a tecnologia e sim na fantasia — na sua história. O importante é apenas apresentar fatos básicos e construir uma trama interessante em cima dessa realidade. Agora, por outro lado, ainda na Realidade Alternativa, há o fato de poder utilizar a magia como o fator crucial de mudança de visão do leitor em cima do nosso mesmo mundo, mas com uma cultura diferente. Em Harry Potter — que é um mestiço de realidade alternativa e mundo imaginário — ainda apresenta a nossa mesma Terra moderna, onde a magia sempre existiu e é um mundo diferente por baixo do nosso. Até mesmo em Nárnia, que ainda é um mundo dentro de um mundo alternativo, ainda é colocado nesse tipo de cenário. Exemplos de Histórias com Worldbuilding de Localidade Real: Podemos pegar como exemplo diversas obras, ocidentais ou orientais, como: Accel World, Sousei no Onmyouji ou Twin Star Exorcists, Sword Art Online, Interestelar ou Avatar (Aquele dos smurfs gigantes). Aqui encontramos um mundo parecido com o nosso, mas com algumas diferenças, podendo ser tecnologica a existência de um mundo escondido (como em Harry Potter) ou até mesmo eventos históricos diferentes, como na série The Man in the High Castle, que conta como seria um mundo em que a Alemanha Nazista venceu a guerra. Mundo Imaginário Sinceramente, este deveria ser o mais chato e complexo tipo de mundo para se explicar, mas fui sabichão o suficiente para distribuir dicas e informações em cada passagem, facilitando demais essa peste de Mundo Imaginário. Imagine ter que falar sobre todos os detalhes que deve se abordar nesse tipo de worldbuilding... Cara, é o boss fodão que só aparece em fantasia e sci-fi. Como é o tipo mais comum em webnovels, já que é um parquinho para fazermos o que quisermos, o Mundo Imaginário nos dá a sensação de necessidade em mostrar e contar tudo. Desde a geografia, história, tradições e costumes, até política, línguas e religiões... É a tristeza encarnada, mas necessária para construirmos um mundo firme e credível para todos. Sem o mínimo de esforço para se basear na nossa realidade, o mundo imaginário pode acabar com a leitura de muita gente facilmente. É nesse momento que você vai agradecer por responder todas aquelas perguntas lá em cima. Porque você vai precisar de tudo pensado e bem firme para a suspensão de descrença dos leitores os manterem tranquilos. Exemplos de Histórias com Worldbuilding de Localidade Real: Talvez o mais simples de todos? Aqui podemos encontrar as obras mais famosas da nossa querida comunidade otaku. Naruto, One Piece, Fairy Tail, tudo isso pode ser considerado um Mundo Imaginário! Os Pecados do Worldbuilding Extra! Aqui vamos lhes dar 5 dicas do que NÃO fazer. Primeiro Pecado: esquecer da infraestrutura básica de seu mundo. Em um mundo diferente até as coisas mais simples podem ser diferentes. Segundo Pecado: não explicar porque as coisas estão acontecendo do jeito que estão. Se os humanos e os elfos estão em guerra, alguma coisa provocou essa guerra, então explique o porquê! Terceiro Pecado: criar grupos sociais, políticos, religiosos e culturais monolíticos. As pessoas são diferentes, elas pensam diferente e têm motivações diferentes por mais que estejam no mesmo grupo. Nem todos irão concordar com tudo que foi estabelecido. Quarto Pecado: inventar uma história completamente lógica. O mundo é um lugar de doido, muita coisa acontece sem ter um motivo. Pessoas erram e tomam decisões estúpidas, sejam elas boas ou ruins. Uma lei desumana como a proibição de batata doce pode existir porque o rei não gostava de batatas. Quinto Pecado: Apresentar algum poder (como magia ou tecnologia) sem parar para pensar em como ela transformaria a sociedade daquele mundo.
- Escrevendo em Primeira Pessoa
Artigo original do site Author Learning Center traduzido por Brinn Quase todos os livros de ficção são escritos em primeira ou terceira pessoa. Porém, quando chega a hora de escolher um para a sua história, como decidir qual ponto de vista usar? Quais são as diferenças entre eles? Como eles afetam a sua história? Escolher um ponto de vista é uma decisão importante. Apesar de a princípio parecerem similares, esses dois pontos de vista podem alterar drasticamente o estilo e tom da sua história. Sendo assim, pense bem na hora de escolher qual deles faz mais sentido de acordo com a história que você deseja contar. Se por um lado a terceira pessoa cria certa distância narrativa entre múltiplos personagens, a primeira pessoa, do outro, gera uma enorme aproximação entre o leitor e o personagem que narra a história. A Diferença entre Primeira e Terceira Pessoa Um narrador personagem se tornará as lentes através das quais o leitor assistirá aos acontecimentos da história, permitindo que eles explorem aspectos mais profundos da personalidade desse personagem além daquilo que é aparente exteriormente. Isso gera uma conexão emocional imediata entre o leitor e o personagem principal, mas também pode ser bem limitante. Como autor, você terá que ser criativo para compartilhar informações que estão além daquilo que o personagem está pensando ou sentindo no momento. Observe as duas passagens a seguir, que são escritas de dois pontos de vista diferentes: “Me pediram para aguardar. A consulta devia ter começado há meia hora, e ainda estou aqui, sentada na sala de espera, folheando a Vogue, pensando em me levantar e ir embora. Sei que consultas médicas passam do horário, mas as de psicólogos? Os filmes sempre me fizeram acreditar que eles enxotam você do consultório assim que seus 50 minutos se encerram. Acho que Hollywood não está se referindo ao tipo de psicólogo que você encontra no sistema de saúde pública. Estou prestes a ir até a secretária e lhe dizer que já esperei demais, que estou indo embora, quando a porta do consultório se abre e um homem muito alto e magro aparece, a expressão constrangida, e me estende a mão.” — Paula Hawkins, A garota no trem “A Sra. Richardson estava de pé no gramado, fechando o robe azul-claro. Embora já passasse do meio-dia, ela ainda estava dormindo quando os alarmes de fumaça dispararam. Tinha ido se deitar tarde, e dormira demais de propósito, dizendo a si mesma que merecia isso depois de um dia difícil. Na noite anterior, observara de uma das janelas do segundo andar a hora em que um carro finalmente estacionou diante da casa. A entrada para carros era comprida e circular, um arco profundo em forma de ferradura que ia da rua até a porta da frente e voltava, de um jeito que a rua ficava a cerca de cem metros de distância, longe demais para que ela a enxergasse direito. Além disso, em maio o dia já estava quase escuro às oito da noite. Mas ela reconheceu o pequeno Volkswagen marrom-claro da inquilina, Mia, com os faróis acesos. A porta do carona se abriu e uma pessoa magra saiu, deixando a porta entreaberta: era a filha adolescente de Mia, Pearl.” — Celeste Ng, Pequenos incêndios por toda parte Você provavelmente deve ter percebido de imediato a enorme diferença de tom entre esses dois trechos. Apesar de ambos descreverem uma mulher em algum tipo de atividade solitária, o primeiro trecho — escrito em primeira pessoa — é muito mais próximo e íntimo que o segundo. Enquanto o segundo trecho te permite ter uma visão mais ampla da cena, o primeiro te apresenta os pensamentos e sentimentos interiores da personagem principal. Você sente a frustração dela com a espera, sua visão e opinião sobre psicólogos e a descrição dos acontecimentos e personagens de acordo com a percepção dela. No geral, o segundo trecho te dá uma visão mais compreensiva da cena, já o segundo te dá uma visão maior da atitude e percepção da personagem principal. Tipos de Primeira Pessoa 1. Pela perspectiva do personagem principal A forma mais comum de primeira pessoa é aquela escrita segundo a perspectiva do protagonista. Isso é quando o personagem principal conta a história diretamente para o leitor. Esse ponto de vista permite que o leitor compreenda a história por meio dos pensamentos e sentimentos do personagem principal. Isso cria uma intensa conexão emocional entre o personagem e o leitor, porque eles são influenciados pela perspectiva desse personagem. Lembre-se: todos os narradores são de alguma forma tendenciosos. Ou seja, quando contar uma história usando essa perspectiva, é bem possível que seu personagem interprete certas coisas de uma forma diferente da qual elas realmente são. Você pode mostrar isso aos leitores por diferenciar a voz de um personagem e suas ações. Quando faz isso, você cria um narrador não confiável, o que significa que seu leitor não pode acreditar objetivamente em tudo que o narrador está lhe contando. Aqui está um exemplo de O apanhador no campo de centeio, de J. D. Salinger: “Apesar disso, às vezes me comporto como se tivesse doze anos. É o que todo mundo diz, principalmente meu pai. Até certo ponto é verdade, mas não é totalmente verdade. As pessoas estão sempre pensando que alguma coisa é totalmente verdadeira. Eu nem ligo, mas tem horas que fico chateado quando alguém vem dizer para me comportar como um rapaz da minha idade. Outras vezes, me comporto como se fosse bem mais velho — no duro — mas aí ninguém repara. Ninguém nunca repara em coisa nenhuma.” 2. Pela perspectiva de um narrador periférico Se você quer que o leitor aprenda sobre o seu personagem por meio dos olhos de outra pessoa, você pode usar um narrador periférico. Seu narrador periférico transmite a história para o leitor, mas ele próprio não é o foco. É quase como uma terceira pessoa, mas seu narrador ainda é um personagem também e não um observador completamente objetivo, portanto, ele está contando a história através do seu ponto de vista e os leitores estão limitados à percepção subjetiva dele. Esse tipo de primeira pessoa é excelente quando você quer manter certo ar de mistério cercando seu personagem principal, mas ainda quer uma narração dos acontecimentos em primeira pessoa através de uma voz narrativa mais marcante. Aqui está um exemplo de O grande Gatsby, de F. Scott Fitzgerald: “Somente Gatsby, o homem que empresta seu nome para esse livro, estava isento dessa minha reação, justamente Gatsby, que representava tudo aquilo que eu desprezava. Se a personalidade é uma série ininterrupta de atitudes bem-sucedidas, então existia alguma coisa de grande beleza nele, uma espécie de sensibilidade aguda para as possibilidades de prazer que a vida oferece, tal como se ele estivesse ligado a uma daquelas máquinas complexas que registram terremotos a quinze mil quilômetros de distância.” 3. No passado Uma vez decidida através da perspectiva de quem você irá contar a sua história, você deve decidir se quer escrevê-la no passado ou no presente. Se escolher escrever no passado, significa que você estará contando ao leitor uma história que já aconteceu. Isso permitirá que o narrador ou personagem principal reflita a respeito do seu eu do passado e prefigure o que está para acontecer. Escrever no passado é de longe a escolha mais comum entre os escritores de ficção e, portanto, é a mais confortável para os leitores. Sendo assim, a menos que você tenha algum grande motivo para escrever no presente, é melhor escolher o tempo passado. Aqui está um exemplo de primeira pessoa no tempo passado de A menina que roubava livros, de Markus Zusak: “A dupla dinâmica de guardas do trem voltou à mãe, à menina e ao corpinho masculino. Lembro-me claramente de que estava respirando alto nesse dia. Fiquei surpresa com o fato de os guardas não me notarem ao passarem por mim. Agora o mundo estava afundando, sob o peso de toda aquela neve.” 4. No presente Escrever uma história no presente — como se os acontecimentos estivessem ocorrendo à medida que são lidos — gera uma sensação de imediatismo para o leitor. Esse tipo de narração é comum em histórias que são contadas através de trechos de um diário, fitas de vídeo ou em algum outro formato que normalmente seria escrito no presente. O presente também é comum em histórias que possuem mais ação do que introspecção. Isso porque os pensamentos do narrador não poderão ser influenciados pelo tempo e por reflexões, assim a história irá parecer seguir mais o fluxo direto de pensamentos do narrador. Aqui está um exemplo de Perdido em Marte, de Andy Weir, que é narrado através de uma série de trechos de um diário: “Nem sei quem vai ler isto. Acho que alguém vai acabar encontrando. Talvez daqui a cem anos. Que fique registrado: não morri em Sol 6. O restante da tripulação certamente achou que eu tivesse morrido, e não posso culpá-los. Talvez decretem um dia de luto nacional em minha homenagem e minha página na Wikipédia vá dizer: ‘Mark Watney foi o único ser humano que morreu em Marte.’” Por que Escolher a Primeira Pessoa? 1. Conexão emocional No geral, a principal vantagem de escrever em primeira pessoa é a conexão emocional que você pode criar entre o seu personagem principal e os leitores. Quando podem ver dentro da própria mente dos personagens, os leitores têm mais facilidade para se sentirem imersos na história e como se fossem parte dela ao invés de simples observadores de fora. Essa conexão emocional permite que você conte uma história movida mais pelo próprio personagem, o que, por assim dizer, é uma história que é influenciada mais pelas experiências dele em si do que pelos acontecimentos externos. 2. Narradores não confiáveis Como mencionado antes, um narrador não confiável é aquele em que o leitor não pode acreditar objetivamente em tudo o que ele diz. Considerando que todas as pessoas são um pouco tendenciosas, todo narrador em primeira pessoa não é, de certo modo, confiável. A narração por meio de um personagem sempre irá tentar guiar a interpretação do leitor a respeito dos acontecimentos. No entanto, cabe a você decidir o nível de importância que isso terá na sua história. Narradores não confiáveis trazem uma nova dinâmica para a história, porque apesar de se sentirem bem conectados com esse personagem, os leitores ainda terão dúvidas daquilo em que podem ou não acreditar. 3. Perspectiva única e interessante Se você escolher escrever uma história em primeira pessoa, seu personagem precisa ter uma voz e ponto de vista cativantes. Isso torna a história muito mais interessante — porque o leitor irá experimentar uma história contada por alguém que leva uma vida muito diferente da sua própria. Quer o seu personagem seja um astronauta, alguém que convive com uma doença, uma pessoa com uma severa doença mental ou alguém vivendo em uma era diferente… todas essas são perspectivas únicas que tornarão a história muito mais interessante para um leitor. Limitações de Escrever em Primeira Pessoa 1. Voz de personagem forte e consistente Se escolher escrever em primeira pessoa, você terá que enfrentar o desafio de implementar a voz de um personagem durante toda a história ao invés de usar sua própria voz de autor. Isso exige bastante consideração, porque a voz desse personagem não apenas precisa ser interessante, como também tem que se manter consistente. A idade, profissão, gênero, classe, era, etnia e educação do seu personagem devem todos ser levados em conta nesse ponto. Apesar de ser um ótimo exercício para expandir suas habilidades de escrita, isso não é nada fácil. Você precisa conhecer o seu personagem por dentro e por fora para ser capaz de escrever nas palavras dele ou dela — e não nas suas. 2. Visão de mundo e perspectivas limitadas Diferente da terceira pessoa, a primeira pessoa não permite mediações do autor. O leitor só pode saber o que o personagem narrador vê, ouve e sabe, então é bem mais difícil inserir comentários, descrições, temas e outros aspectos de uma história. Você também precisa tomar o cuidado de limitar a quantidade de personagens narradores. Afinal, muitas mudanças de perspectiva só irão confundir o leitor. Isso para não falar que torna a tarefa de criar várias vozes únicas muito mais difícil para você como autor. Se você descobrir que precisa de mais de algumas perspectivas para contar a sua história, considere usar a terceira pessoa. Será muito mais fácil alternar entre os personagens sem os leitores esquecerem quem é quem. 3. Mais difícil de mostrar ao invés de dizer Se você já leu algum artigo sobre dicas de escrita, provavelmente já ouviu alguém dizer “mostre, não diga”. Inclusive temos um artigo no blog sobre, basta clicar aqui para ler. Esse conselho ressalta a importância de mostrar ao leitor o que está acontecendo ao invés de simplesmente dizer a eles, o que torna a história muito mais interessante e envolvente. Como a escrita em primeira pessoa é tão focada na narrativa, é muito mais fácil cair no erro de contar ao invés de mostrar. É bem provável que você tenha dificuldade para escrever frases que não comecem com “eu”. Sendo assim, vai exigir tempo e esforço para ser capaz de produzir uma boa variação de sentenças. Por exemplo, ao invés de dizer “eu estava com fome”, você poderia dizer “quando senti o cheiro da comida que ele colocou na minha frente, meu estômago roncou”. A primeira pessoa também torna muito mais difícil escrever descrições que não parecem forçadas. Você não vai querer depender do velho clichê de fazer seu personagem principal olhar para o espelho e descrever a própria aparência. Além de não ser realista, isso acaba com a imersão dos leitores. Ao invés disso, aproveite o máximo possível dos diálogos. Eles serão seus maiores aliados para revelar descrições e informações que não são incorporadas com tanta facilidade assim na narração de um personagem. Por exemplo, ao invés de dizer “eu olhei no espelho e vi que meu cabelo agora estava cortado logo abaixo do meu queixo”, tente algo como “ele olhou para mim por menos de um segundo antes de dizer: ‘Você cortou o cabelo?’” Escolhendo entre Primeira e Terceira Pessoa Quando o assunto é ponto de vista, nenhum dos dois é mais popular ou comercializável do que o outro. Ambos são amados na mesma medida pelos leitores, sendo assim, escolha aquele que mais se adequa às demandas da sua história. Se mesmo assim você ainda não tem certeza de qual escolher, pense um pouco nas seguintes perguntas e veja se a resposta não fica mais clara: O seu personagem principal ou narrador possui uma visão de mundo ou perspectiva única? É importante que o leitor desenvolva uma conexão emocional imediata com o protagonista? A visão do seu personagem determina o rumo da história ao invés dos acontecimentos externos? Os pensamentos internos dele são essenciais para a história? Sua história pode se beneficiar de um narrador não confiável? Você é capaz de contar a sua história sem comentários externos ou uma perspectiva objetiva mediadora? Se você respondeu sim para a maioria ou para todas essas perguntas, então você provavelmente deveria escrever o seu livro em primeira pessoa. Este artigo foi postado originalmente no site Author Learning Center e traduzido por Brinn, membro ilustre da Novel Brasil. Eu, RenCmps, fiz apenas a edição. Obrigado por terem lido.
- Entenda os Pontos de Vista!
Artigo escrito por Joe Bunting e traduzido por Brinn Ponto de Vista: Terceira Pessoa Onisciente vs. Terceira Pessoa Limitada vs. Primeira Pessoa Na minha experiência como editor, os problemas de ponto de vista estão entre os principais erros cometidos pelos escritores iniciantes, o que acaba erodindo sua credibilidade e a confiança dos leitores. No entanto, ponto de vista não é um conceito fácil, já que há tantos entre os quais escolher: primeira pessoa, terceira pessoa limitada, terceira pessoa onisciente, segunda pessoa. Afinal, o que isso significa? E como escolher o certo para a sua história? Todas as histórias são escritas de um ponto de vista. Porém, quando o ponto de vista dá errado — e acredite em mim — isso pode acontecer com bastante frequência, você ameaça qualquer confiança que seus leitores poderiam ter em você. Não só isso, como também rompe a suspensão da descrença deles. No entanto, é fácil dominar o ponto de vista se você usar o senso comum. Esse artigo irá definir o que é ponto de vista, analisar cada um dos principais POVs, explicar algumas de suas regras e, então, apontar os maiores erros nos quais os escritores acabam caindo ao lidar com cada ponto de vista. Definição de Ponto de Vista O ponto de vista, ou POV, de uma história é a posição do narrador na descrição dos eventos e vem do termo em latim punctum visus, que significa literalmente ponto de visão. O ponto de vista é onde o escritor aponta a visão do leitor. Note que o ponto de vista também possui uma segunda definição. Em uma discussão, um debate ou na escrita não ficcional, o ponto de vista é uma opinião sobre um assunto. Esse não é o tipo de ponto de vista no qual nós iremos nos concentrar nesse artigo (apesar de ser útil para escritores de não ficção e, para mais informações, eu recomendo checar o princípio de imparcialidade da Wikipédia). Eu gosto bastante da forma como os alemães se referem ao POV, no caso, gesichtspunkt, que pode ser traduzido como “ponto da face”, ou para onde sua face está apontada. Essa não é uma boa alusão visual para o que está envolvido em ponto de vista? Note também que o ponto de vista às vezes pode ser chamado de “tipo de narrador”. Porque o ponto de vista é tão importante Por que o ponto de vista importa tanto? Porque o ponto de vista filtra tudo na sua história. Tudo na sua história precisa vir de um ponto de vista. O que significa que se você errar nele, toda a sua história será afetada. Por exemplo, eu acabei de terminar de julgar uma competição de escrita para a The Write Practice Pro. Eu li e avaliei pessoalmente mais de noventa histórias e encontrei erros de ponto de vista em cerca de vinte por cento delas, inclusive em histórias que poderiam ter obtido uma classificação muito mais alta se seus autores não tivessem cometido os erros que nós iremos discutir em breve. A pior parte é que esses erros são facilmente evitáveis se você estiver ciente deles. Porém, antes de mergulharmos nos erros de ponto de vista mais comuns, vamos primeiro ver quais são os quatro tipos de POVs. Os quatro tipos de ponto de vista Aqui estão os quatro tipos de POV primários na ficção: Primeira Pessoa. A primeira pessoa é quando “eu” estou contando a história. O personagem está na história, diretamente relatando suas experiências. Segunda pessoa. A história é contada para “você”. Esse POV não é comum na ficção, mas ainda é bom conhecê-lo (ele é comum em não ficção). Terceira pessoa, limitada. A história é sobre “ele” ou “ela”. Esse é o ponto de vista mais comum em ficção comercial. O narrador está fora da história e relata as experiências de um personagem. Terceira pessoa, onisciente. A história ainda é sobre “ele” ou “ela”, mas o narrador tem acesso total aos pensamentos e experiências de todos os personagens da história. Eu sei que você já deve ter visto e provavelmente até usado a maioria desses pontos de vista. Nós iremos discutir cada um desses quatro tipos, usando exemplos para ver como eles afetam a sua história. Também veremos quais são as regras de cada um deles, mas primeiro, permita-me explicar qual é o maior erro que você não deve cometer com o ponto de vista. O #1 Erro de POV Uma vez que você tenha escolhido o seu ponto de vista, você não pode mudá-lo. Não comece a sua história em primeira pessoa e então mude para terceira pessoa. Não comece em terceira pessoa limitada e, então, abruptamente dê ao seu narrador completa onisciência. A diretriz que eu aprendi na minha primeira aula de escrita criativa na faculdade é muito boa: "Estabeleça o ponto de vista nos primeiros dois parágrafos da sua história." E, acima de tudo, evite mudar o seu ponto de vista. Se fizer isso, você ameaçará a confiança do seu leitor e pode acabar danificando a estrutura da sua história. Tendo dito isso, recentemente eu terminei uma novel de 7.000 páginas chamada Worm, que usa dois pontos de vista — primeira pessoa com interlúdios em terceira pessoa limitada — de forma bem eficaz. A propósito, se você está procurando uma novel para ler nos próximos dois a seis meses, eu a recomendo bastante. A primeira vez que o autor trocou de ponto de vista, eu quase perdi a minha confiança. No entanto, ele manteve a consistência desses dois POVs durante todas as 7.000 páginas e fez funcionar. Independentemente de qual tenha sido a sua escolha de ponto de vista, seja consistente. Ponto de vista em primeira pessoa No ponto de vista em primeira pessoa, o narrador está na história e relata os eventos pelos quais ele ou ela está passando pessoalmente. A forma mais simples de entender a primeira pessoa é que a narração irá usar pronomes em primeira pessoa como "eu", "me" e "meu". Aqui está um exemplo de ponto de vista em primeira pessoa de Moby Dick, por Herman Melville: Podes me chamar de Ismael. Há alguns anos — não importa quantos, precisamente – com pouco ou nenhum dinheiro na carteira e sem qualquer interesse particular na terra, decidi navegar um bocado e ver a parte aquática do mundo. A primeira pessoa é um dos pontos de vista mais comuns encontrados na ficção. Se você nunca leu um livro em primeira pessoa, então você não tem lido direito. O que torna esse ponto de vista interessante, e desafiador, é que todos os eventos na história são filtrados pelo narrador e explicados na sua própria voz única. Isso significa que a narração em primeira pessoa é tanto tendenciosa quanto incompleta. Outros exemplos de ponto de vista em primeira pessoa podem ser encontrados em livros como: O Sol Também se Levanta, por Ernest Hemingway Crepúsculo, por Stephenie Meyer Jogador Número Um, por Ernest Cline Jogos Vorazes, por Suzanne Collins O Grande Gatsby, por Scott Fitzgerald Se você nunca leu um livro em primeira pessoa, então você não tem lido direito. Narrativa em primeira pessoa é única da escrita Não existe esse negócio de primeira pessoa no cinema ou no teatro — apesar de locuções e entrevistas simuladas como em The Office ou Família Moderna fornecerem certo nível de narração em primeira pessoa na narração em terceira pessoa dos filmes e programas de televisão. Inclusive, as primeiras novels foram escritas em primeira pessoa, inspiradas nos populares diários e autobiografias. Ponto de vista em primeira pessoa é limitado Narrações em primeira pessoa são feitas pela perspectiva de um único personagem por vez. Eles não podem estar em todos os lugares ao mesmo tempo, sendo assim, não tem todos os lados da história. Eles estão contando sua história, não necessariamente a história. Ponto de vista em primeira pessoa é tendencioso Em novels em primeira pessoa, o leitor quase sempre simpatiza com o narrador, mesmo se ele for um anti-herói com graves defeitos. Justamente por isso que nós amamos tanto a narrativa em primeira pessoa, porque ela é marcada pela personalidade do personagem, pela sua perspectiva única do mundo. O uso mais extremo desse tipo de tendência é chamado de narrador não confiável. Alguns escritores utilizam das limitações da narração em primeira pessoa para surpreender o leitor, uma técnica que é chamada de narrador não confiável. Você pode perceber esse tipo de narrador sendo usado quando você, como leitor ou plateia, descobre que não pode confiar no narrador. Por exemplo, Garota Exemplar, de Gillian Flynn, coloca dois narradores não confiáveis um contra o outro. Cada um relata sua própria versão conflitante dos eventos, um por meio da típica narração e outro por meio de trechos de um diário. Outros usos interessantes da narração em primeira pessoa O clássico O Coração das Trevas na verdade é uma narração em primeira pessoa dentro de uma narração em primeira pessoa. O narrador reconta palavra por palavra a história que Charles Marlow lhe contou sobre sua viagem ao rio Congo enquanto eles estão sentados em um porto na Inglaterra. Absalão, Absalão! de William Faulkner é narrado pelo ponto de vista em primeira pessoa de Quentin Compson; no entanto; a maior parte da história é um relato em terceira pessoa de Thomas Sutpen, seu avô, como foi dito a Quentin por Rosa Coldfield. Sim, é tão complicado quanto parece! O premiado Os Filhos da Meia-Noite de Salman Rushdie é narrado em primeira pessoa, mas passa a maior parte das primeiras centenas de páginas dando um relato preciso em terceira pessoa da vida dos ancestrais do narrador. Ainda é em primeira pessoa, só que é um narrador em primeira pessoa contando uma história sobre outra pessoa. Dois grandes erros que os escritores cometem ao usar o ponto de vista em primeira pessoa Quando escrevem em primeira pessoa, esses sãos os dois principais erros que os escritores cometem: O narrador não é simpático: Seu protagonista não precisa ser um herói clichê. Na verdade, ele nem precisa ser bom. No entanto, ele precisa ser interessante. Os leitores não vão ficar 300 páginas ouvindo um personagem que eles não gostam. Esse é um dos motivos de os anti-heróis serem narradores em primeira pessoa tão bons. Eles podem até não ser moralmente perfeitos, mas quase sempre são interessantes. O narrador conta, mas não mostra: O perigo da primeira pessoa é que você pode passar tempo demais na cabeça do seu personagem, explicando o que ele está pensando e como se sente sobre a situação. Você pode mencionar o humor do seu personagem, mas não se esqueça de que a confiança e a atenção do seu leitor depende do que o seu personagem faz, não do que ele pensa em fazer. Ponto de Vista em Segunda Pessoa Apesar de não ser muito usado na ficção — ele é mais comum em não ficção, letras de músicas e até em vídeo games — ainda pode ser útil entender o POV em segunda pessoa. Nesse ponto de vista, o narrador relata as experiências usando os pronomes de segunda pessoa como “você” e “seu”. Assim você se torna o protagonista, você faz o enredo se mover e é o seu destino que determina a história. Nós já fizemos um artigo sobre porque você deveria tentar escrever em segunda pessoa, mas, resumindo, nós gostamos da segunda pessoa porque isso: Insere o leitor na ação da história; Torna a história pessoal; Surpreende o leitor; Amplia as suas habilidades como escritor. Aqui está um exemplo do extraordinário bestseller Brilho da Noite, Cidade Grande de Jay Mclnerney (provavelmente o exemplo mais popular que utiliza o ponto de vista em segunda pessoa): Você tem amigos que realmente se importam com você e falam a língua do seu eu interior. Você tem os evitado ultimamente. A sua alma está tão bagunçada quanto o seu apartamento e até arrumá-la um pouco, você não quer convidar ninguém para entrar. O ponto de vista em segunda pessoa não é usado com muita frequência, porém ainda há alguns exemplos notáveis dele. Alguns outros livros que usam o ponto de vista em segunda pessoa são: Você se lembra da série Escolha Sua Aventura? Se você já leu algum desses livros onde você escolhe o destino do personagem (eu sempre matava os meus, infelizmente), você já leu uma narrativa em segunda pessoa. A Quinta Estação, por N.K. Jemison A abertura de O Circo da Noite, por Erin Morgenstern Também há várias novels experimentais e contos que usam a segunda pessoa. Até mesmo escritores como William Faulkner, Nathaniel Hawthorne e Albert Camus já brincaram com esse estilo. Quebrando a quarta parede Nas peças de William Shakespeare, um personagem às vezes se virava na direção da plateia e falava diretamente com ela. Em Sonho de uma Noite de Verão, Puck diz: Se nós sombras ofendemos, pense nisso e tudo bem. Vocês apenas dormiam enquanto essas visões viam, e esse tema fraco e vago não passou de um sonho. Essa técnica de falar diretamente com a plateia ou o leitor é chamada de quebrar a quarta parede (sendo que as outras três são o cenário da história). Pensando em outra perspectiva, é uma forma de o escritor brevemente usar a segunda pessoa no meio. Isso é bem divertido! Você devia tentar. Ponto de Vista em Terceira Pessoa Na terceira pessoa, o narrador está fora da história e relatando as experiências de um personagem. O personagem central não é o narrador. Na verdade, o narrador nem faz parte da história. A forma mais simples de compreender a narração em terceira pessoa é que ela usa os pronomes em terceira pessoa, como “ele/ela”, “dele/dela”, “eles/deles”. Existem dois tipos desse ponto de vista: Terceira Pessoa Onisciente O narrador tem acesso total a todos os pensamentos e experiências de todos os personagens da história. Exemplos de Terceira Pessoa Onisciente: Guerra e Paz, por Leo Tolstoy; Um Lugar Bem Longe Daqui, por Delia Owens; O Velho e o Mar, por Ernest Hemingway; Natureza Morta, por Louise Penny (e toda a série do Inspetor-chefe Gamache, que, a propósito, é incrível); Gossip Girl, por Cecily von Ziegesar; Um Estranho Sonhador, por Laini Taylor; Mulherzinhas, por Louisa May Alcott; Asiáticos Podres de Ricos, por Kevin Kwan (uma das minhas histórias favoritas!); O Feiticeiro de Terramar, por Ursula Le Guin; Orgulho e Preconceito, por Jane Austen. Terceira Pessoa Limitada O narrador só tem acesso, isso é, se de fato tiver algum, a apenas parte dos pensamentos e experiências dos personagens da história e muitas vezes, é a apenas de um personagem. Exemplos de Terceira Pessoa Limitada Aqui está um exemplo de terceira pessoa limitada em Harry Potter e a Pedra Filosofal, de J.K. Rowling: Uma brisa arrepiou as cercas bem cuidadas da rua dos Alfeneiros, silenciosas e quietas sob o negror do céu, o último lugar do mundo em que alguém esperaria que acontecessem coisas espantosas. Harry Potter virou-se dentro dos cobertores sem acordar. Sua mãozinha agarrou a carta ao lado, mas ele continuou a dormir, sem saber que era especial, sem saber que era famoso... Ele não podia saber que, neste mesmo instante, havia pessoas se reunindo em segredo em todo o país que erguiam os copos e diziam com vozes abafadas: — A Harry Potter: o menino que sobreviveu! Alguns outros exemplos de narrativa em terceira pessoa limitada incluem: A série As Crônicas de Gelo e Fogo, por George R.R. Martin (apesar de possuir vários personagens principais, Martin permanece no ponto de vista de um personagem por vez, tornando-a um claro exemplo de POV limitado); Por Quem os Sinos Dobram, por Ernest Hemingway; The Way of Kings, por Brandon Sanderson; O Código Da Vinci, por Dan Brown; Os Homens que Não Amavam as Mulheres, por Stieg Larsson; Ulisses, por James Joyce; El Amor en los Tiempos del Cólera, por Gabriel Garcia Marquez; 1984, por George Orwell; O Trem dos Órfãos, por Christina Baker Kline; Destinos e Fúrias, por Lauren Groff. Você Deve Usar Terceira Pessoa Onisciente ou Terceira Pessoa Limitada A diferença entre a terceira pessoa limitada e a onisciente é bem confusa e até um pouco artificial. A onisciência completa é rara nos livros — quase sempre ela é limitada de alguma forma — só porque não é muito agradável para a mente humana lidar com todos os pensamentos e emoções de várias pessoas ao mesmo tempo. O mais importante a se considerar quando usar o ponto de vista em terceira pessoa é o seguinte: O quão onisciente você pretende ser? O quão fundo você vai mergulhar na mente do seu personagem? Você irá revelar seus pensamentos mais profundos sempre que possível? Ou você, raramente, se é que pretende fazer isso em algum momento, vai se aprofundar nas suas emoções? Para ver essa questão na prática, imagine um casal tendo uma briga. Tina quer que Fred vá ao mercado comprar o coentro que ela esqueceu e que precisa para a refeição que está preparando. Fred está frustrado porque ela não pediu para ele pegar o coentro na volta do trabalho para casa, antes de ele ter colocado suas roupas de “ficar em casa” (no caso, a cueca samba-canção). Se o narrador for completamente onisciente, você analisa as emoções tanto de Fred quanto de Tina a cada troca de palavras? — Você quer comer? Se quiser, então você precisa ir comprar o coentro ao invés de ficar aí, agindo como um porco preguiçoso. — Tina disse, pensando, eu não acredito que eu me casei com esse babaca. Pelo menos naquela época ele ainda tinha um tanquinho, não essa barriga cabeluda. — Dê o seu jeito, Tina. Eu estou cansado de correr até o mercado toda vez que você se esquece de alguma coisa — disse Fred. Ele sentia a raiva pulsando por toda a sua grande barriga. Ir e voltar entre as emoções de vários personagens dessa forma pode se tornar cansativo para o leitor, em especial, se esse padrão se manter por várias páginas e com mais de dois personagens. Esse é um exemplo de um narrador onisciente que talvez esteja um pouco confortável demais explicando como funciona a mente de seus personagens. “Mostre, não conte”, é o que nos dizem. Compartilhar todas as emoções de todos os seus personagens pode se tornar uma distração. Isso pode até destruir qualquer tensão que você tenha construído. O drama requer mistério. Se o leitor souber as emoções de cada personagem o tempo todo, não haverá espaço para drama. Como Lidar com a Terceira Pessoa Onisciente? A forma como muitos editores e autores famosos lidam com isso é por mostrar os pensamentos e as emoções de apenas um personagem por cena (ou por capítulo). George R.R. Martin, por exemplo, usa “personagens do ponto de vista”, um personagem do qual ele sempre tem acesso completo para compreender. Assim, ele só muda o ponto de vista para outro personagem após escrever um capítulo inteiro da perspectiva de um único personagem específico. Quanto ao resto do elenco, ele permanece fora de suas cabeças. Essa é uma sugestão eficaz, se não uma regra obrigatória e é o que eu costumo sugerir para qualquer autor iniciante que quer experimentar a narração em terceira pessoa. No geral, entretanto, o princípio de mostre, não conte deve ser o seu guia. O Maior Erro do Ponto de Vista em Terceira Pessoa Onisciente O maior erro que eu vejo os escritores constantemente cometerem na terceira pessoa são os saltos de perspectiva. Quando você muda do ponto de vista de um personagem para o outro muito rápido, ou mergulha nas cabeças de muitos personagens ao mesmo tempo, você pode correr o risco de fazer o que os editores chamam de “saltos de perspectiva”. Quando um narrador muda dos pensamentos de um personagem para o outro muito rápido, isso pode distrair o leitor e quebrar a intimidade com o personagem principal da cena. Nós já escrevemos sobre como você pode evitar saltar de uma perspectiva para a outra o tempo todo, mas é uma boa ideia tentar evitar entrar na cabeça de mais de um personagem por cena ou por capítulo. Qual Ponto de Vista Você Vai Usar? Aqui está um infográfico sobre ponto de vista que pode te ajudar a decidir qual POV usar na sua história: Note que essas distâncias devem ser encaradas como aproximações e não cálculos precisos. Um narrador em terceira pessoa pode muito bem se aproximar muito mais do leitor do que um narrador em primeira pessoa. O mais importante de tudo é que não existe um ponto de vista melhor. Todos esses pontos de vista são eficazes em vários tipos de histórias. Se você acabou de começar, eu o encorajaria a começar ou pela primeira pessoa ou pela terceira pessoa limitada, porque elas são mais fáceis de entender. No entanto, isso não deve impedi-lo de experimentar. Afinal, você só vai ficar confortável com os outros pontos de vista se tentar! Independentemente de qual seja a sua escolha, seja consistente. Evite os erros que eu mencionei sobre cada ponto de vista. E, acima de tudo, divirta-se! Obs.: E quanto a você? Quais desses quatro pontos de vista você já usou na sua escrita? Por que você os escolheu e o que você gosta neles? Compartilhe nos comentários. PRATIQUE Usando um ponto de vista que você nunca usou antes, escreva uma breve história sobre um adolescente que acabou de descobrir que ele ou ela tem superpoderes. Certifique-se de evitar os erros de POV listados no artigo acima. Escreva por quinze minutos. Quando o tempo acabar, poste o seu exercício nos comentários. Se você postar, por favor, lembre-se de dar feedback para os outros participantes. Nós podemos aprender tanto dando feedback quanto ao escrever nossas próprias histórias! Boa escrita!